Educação em Ontário e Toronto: o que muda no ano letivo de 2018-2019

As aulas no Canadá começam na primeira semana de setembro. Para o ano letivo de 2018-2019, em Toronto e Ontário, teremos algumas mudanças relacionadas à educação que me decepcionaram, pois acredito que irão prejudicar os alunos.

Educação no Canadá

Extinção do extented day nas escolas católicas de Toronto

Essa é uma mudança exclusiva do TCDSB, que são as escolas católicas de Toronto.

Para quem não sabe, algumas escolas da rede católica operavam em regime de extended day. Isso significa que tinham 30 minutos extras por dia no horário escolar. Nessas escolas as aulas começavam às 8:30h ao invés de 9h. Esse tempo extra foi adicionado para incorporar o Internacional Languages dentro horário de aula. Esse programa gratuito proporciona aos alunos a chance de aprender outros idiomas não oficiais do país como italiano, espanhol, português, etc. Nas escolas que não aderiram ao extended day, o International Languages é oferecido num horário alternativo, geralmente no sábado de manhã. Quem ensina o programa é um professor de idioma, não é o mesmo que ensina as outras matérias.

Acontece que depois de uma negociação com o sindicato dos professores, o TCDSB extinguiu o extended day em 44 escolas. Isso aconteceu porque os professores tinham que ficar na escola 30 minutos a mais por dia e não recebiam pagamento para isso. E quando o professor de idiomas faltava, eles precisavam ficar com os alunos. Ou seja, estavam trabalhando de graça.

O problema é que ao invés de oferecer o programa de idiomas num horário alternativo, como já é feito em outras escolas da rede, o TCDSB decidiu manter o programa dentro do horário de aula, subtraindo 30 minutos do tempo que os alunos tem para aprender matérias importantes como história, geografia e ciências.

Educação no Canadá

Em Ontário, o Ministério da Educação determina que os alunos precisam ter 300 minutos ao dia de instrução. E isso não inclui idiomas que não sejam oficiais no país. Veja a lei aqui

Com a mudança, os alunos de 44 escolas terão menos tempo do que o mínimo para aprender o mesmo currículo. Por lei, algumas matérias como matemática, francês e educação física tem carga horária mínima definida, mas outras não. Então eles vão ter que diminuir o tempo dedicado a outras matérias para poder ensinar um outro idioma.

Eu entendo que aprender outros idiomas é muito importante e traz muitos benefícios para qualquer pessoa. Porém achei um absurdo sacrificar matérias obrigatórias no currículo, bastava oferecer os idiomas num horário alternativo, como já é feito. Mas o motivo da decisão foi economizar, então fizeram dessa forma, prejudicando os alunos.

E para piorar, notificaram aos pais sobre a mudança na última semana de aula. Assim não deu tempo de reclamar. Mesmo assim foi a maior confusão e houveram reuniões com membros da comunidade e uma votação para finalizar a decisão deles.

Durante esse período de reuniões, começou a circular nas mídias sociais notícias e até petições que diziam que o TCDSB ia cancelar o International Languages em toda a rede se os pais não apoiassem essa mudança de espremer o programa dentro do dia normal, mesmo sacrificando 30 minutos de instrução de outras matérias. Claro que, quando colocado dessa forma, muita gente abraçou a causa, sem saber que nunca foi intenção deles extinguir o programa. E os pais de 44 escolas que brigaram para que o TCDSB continuasse oferecendo o programa nas mesmas condições das outras 124 escolas da rede, perderam a batalha por enquanto.

Nessas 44 escolas que foram afetadas pela mudança os alunos terão 60 minutos de matemática e 60 de gramática por dia, mas apenas 70 minutos (ao invés de 100) para dividir entre estudos sociais (história e geografia), ciências e artes. O resto do tempo será dividido entre Francês, Religião, atividade física e idioma internacional. As minhas filhas estudam em uma dessas 44 escolas.

Reintroduzir o antigo currículo de educação sexual de Ontário

A eleição de um novo Premier (governador) em Ontário trouxe algumas mudanças inesperadas ao sistema educacional. Uma delas foi reverter o currículo de educação sexual para o antigo, que foi feito em 1998, e está completamente desatualizado. A decisão foi tomada sem nenhum tipo de pesquisa ou consultoria com pais e educadores.

A mudança gerou a maior polêmica pois o currículo antigo não trata de questões atuais como bullying online, identidade de gênero, casamento homossexual, etc.

O currículo atual foi aprovado em 2015 e na época também gerou críticas. Algumas pessoas acharam muito moderno e não se sentiram à vontade sabendo que certos assuntos seriam tratados em sala de aula. Só que muita gente reclamou mas não procurou se informar sobre o que é ensinado e nem quando. E faziam alegações absurdas como se crianças de 4 anos estivessem aprendendo sobre sexo ou sendo incentivadas a ser homossexuais.

Os temas são abordados dentro do contexto de cada idade. No Grade 1, eles ensinam o nome correto dos órgãos genitais. No Grade 2 aprendem de uma forma bem generalizada que quando alguém fala não para alguma coisa, precisa respeitar. No Grade 3 eles começam a introduzir o conceito de identidade de gênero. Puberdade nos Grades 4 e 5. E sexo só começa a ser discutido mesmo a partir do Grade 6. Até o Grade 8 eles vão aprender sobre contraceptivos, gravidez, cyber bullying, homossexualismo, respeitar as diferenças, etc.

Infelizmente não são todos os pais que conversam com seus filhos sobre todos os temas. Portanto é fundamental que temas atuais sejam abordados na escola. Assim os alunos tem uma chance de tirar dúvidas. Afinal, a falta de informação pode gerar pessoas mais vulneráveis ou mais preconceituosas.

Nessa reportagem, em inglês, eles detalham exatamente o que era ensinado em cada série, no currículo novo, que foi rejeitado pelo governo eleito em 2018. E aqui tem a página oficilal do governo com o currículo de 2015.

Depois de ser bombardeado de críticas e de várias secretarias de educação repudiarem o antigo currículo, o novo governador prometeu fazer uma pesquisa para determinar o que fazer a partir de 2019/2020. Mas por enquanto fica o velho currículo e vamos fingir que vivemos em 1998.

Cancelar a atualização do currículo que inclui mais sobre os First Nations

O currículo educacional em Ontário precisa ser atualizado em vários assuntos. E como parte dessa atualização havia um plano aprovado para reescrever o currículo incluindo mais sobre cultura, história e contribuições dos First Nations (povos indígenas) no Canadá.

Educação

O programa de ensino atual não conta a história completa sobre as interações entre o governo e os povos indígenas. Deixando de fora aspectos importantes da história canadense ou abordando de uma forma que minimiza a gravidade do que foi feito. Um exemplo disso são os colégios internos para crianças indígenas, que forçavam o aprendizado de uma cultura e religião diferentes da delas.

Mas infelizmente o novo governo provincial decidiu cancelar essa atualização. A justificativa foi corte de gastos. Leia mais aqui.

Apesar de ter citado duas mudanças que foram consequências direta do novo governo provincial, isso não é um post político. Apenas quis informar o que está acontecendo e não considero um benefício para os estudantes.

Veja outros posts sobre educação no Canadá.

Livi

Baiana expatriada em Toronto. Adora escrever sobre suas viagens em família e experiência de vida em Toronto

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12 Resultados

  1. Elane Dutra disse:

    Boa tarde! Comecei a ler seu blog faz pouco tempo, mas o que já li meu deu uma noção clara de como é a vida no Canadá, em especial em Ontário. Parabéns pelo seu trabalho e obrigada por sua contribuição.

  2. Camila disse:

    Bom dia, Livi!
    Venho acompanhando o site a um bom tempo, com os conteúdos importantes ao longo desses meus dois anos, os quais meu marido está no Canada (Toronto), e eu e meu filho no Brasil.

    Meu marido tem trabalho, e um workpermit full time. Porém estamos indo em Dezembro agora com o visto de turista, ou seja, 6 meses. Antes disso queremos regularizar, pois o plano é continuar no Canada. Mas…..durante esses meses que eu estaremos como turista e somente o Mauricio tem workpermit, eu não queria que o Vitor ficasse sem acesso a escola. É muito tempo.

    Eu tenho buscado MUITA informação, e caí aqui no seu site novamente, e vi o conteudo sobre o TDSB sobre o “aluno sem status migratório”, você até colocou uma parte da política deles que fala sobre a aceitação das crianças nesse status.

    Você sabe me dizer se é possível mesmo? Ou é somente na teoria, e na prática os pais não estão conseguindo?
    Se puder dividir comigo sua experiência ou das pessoas que conhece, eu agradeço MUITO!!!

    OBRIGADA!!

    • Livi disse:

      Oi Camila,
      Tudo bem?
      Como o teu marido tem work permit o seu filho te direito a estudar gratuitamente. Leve os documentos que comprovam o status do seu marido na hora da matrícula.
      As crianças sem status são aquelas que o visto já venceu. Se o teu marido não tivesse o permit e vocês tivessem o visto de turista, o seu filho não poderia estudar gratuitamente.

      Se tiver algum problema na escola vá no board (TCDSB ou TDSB). Beijos!

  3. kleber disse:

    Eu, particularmente, sou contra usar impostos para financiar o ensino de línguas estrangeiras. Esse dinheiro poderia ser melhor investido em retomando atividades esportivas ou de artes “pós sala-de-aula” (que existiam até o último governo conservador) para manter os jóvens engajados em atividades sadias aos invés de estarem envolvidos em “outras” a volta do Eaton Centre.

    Quanto à educação sexual nas escolas, concordo que a lei atual deveria ser mantida, à exceção da ideologia do gênero. Como disse o Jordan Peterson, muito sensatamente, esse é um conceito que evoluirá naturalmente dentro da sociedade, com o tempo, e não se pode simplesmente transformá-lo numa matéria de um programa escolar.

    Já em relação às Primeiras Nações, acredito que devam fazer parte do programa de história para se entender melhornos desafios por que eles passam dentro da sociedade atual. E acho que deveria existir uma materia opcional nas escolas de ensino médio (High Schools, como as chamamos aqui) para se aprender mais sobre uma cultura tão rica.

    • Livi disse:

      Oi Kleber,

      Concordo com todos os seus pontos!

      Acho importante aprender uma língua estrangeira mas isso deveria ser oferecido nas escolas se sobrasse verba depois de pagar pelas inúmeras melhorias que as escolas estão precisando no momento. Minha filha está no Grade 4 e não tem workbook de matemática e nem papel para a professora imprimir atividades. Mas a aula de italiano segue. E o pior é que os pais não podem comprar/doar o livro para ser usado em sala de aula pois a lei não permite.

      Sobre a educação sexual nas escolas, acho que deveria ter sido feito um estudo para aperfeiçoamento do programa e não um retrocesso. Sobre falar de identidade de gênero, não vejo problemas. Não é uma matéria e nem um incentivo para ninguém ser uma coisa ou outra. É apenas uma oportunidade de falar de um assunto que é realidade na nossa sociedade e que sim, irá evoluir naturalmente. Acho pior fingir que não existe ou discriminar uma pessoa com base nisso por falta de informação. Mas a verdade é que não importa o que seja decidido em relação a educação sexual nas escolas, nunca irá agradar a todos, né?

      E sobre o que você disse sobre as Primeiras Nações, com certeza! 🙂

  4. Oi, Livi, muito obrigada por este post tão esclarecedor. Uma pena saber de todos esses retrocessos. Torcer para que a mobilização da sociedade tenha força para mudar e uma dica para ficarmos atentos às causas que abraçamos sem nos informarmos direito sobre o assunto. Eu mesma caí nessa da petição e, depois de você ter me explicado a situação, fiquei p da vida pela má-fé intencional de como o texto foi escrito, com a intenção de persuadir. Obrigada duplamente! Bjs

  5. Bianca disse:

    Nem tudo sao flores né. Adorei o post. Bom saber quando eh bom e quand nao eh.

  6. Joelma disse:

    Obrigada pelo seu texto

  7. Cristiane disse:

    Oi Livi… vc sabe onde consigo acessar a lista com essas 44 escolas? Obrigada

  8. Maíra disse:

    Quanto retrocesso! Uma pena…

  9. Mariana Nadai disse:

    Muito bacana o seu texto e muito importante os seus apontamentos e indignações. Penso exatamente como você em relação à importância dessas matérias e ensinamentos ma escola. Ontário perde com essas mudanças…

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